Uso Perioperatório do Complexo Protrombínico: (CCPs)

Associado Colaborador: Patrícia Wajnberg Gamermann

Os concentrados de complexo protrombínico (CCPs) são compostos altamente purificados. Eles contêm os fatores de coagulação dependentes da vitamina K (Fator II, IX e X e quantidades variáveis do Fator VII). Os CCPs foram desenvolvidos, originalmente, para o tratamento da hemofilia B. Os produtos são categorizados em CCPs com três fatores (CCPs-3F), que não contêm FVII ou apenas quantidades mínimas dele, ou quatro fatores (CCPs-4F), que contem o FVII.

A indicação clássica desses fármacos é a reversão emergencial dos fármacos antagonistas da vitamina K (cumarínicos). Pacientes com coagulação intravascular disseminada (CIVD) apresentam contra-indicação absoluta ao uso. Os CCPs também não são recomendados em pacientes com história de trombocitopenia induzida pela heparina e naqueles com alto risco de trombose.

Reversão de Antagonistas da Vitamina K: Quando comparados com o plasma fresco congelado (PFC), que demora horas para reversão da anticoagulação, os CCPs apresentam ação mais rápida e atingem bons resultados em alguns minutos. São necessários volumes 15 à 30 vezes maiores de PFC para efeito equivalente à administração de CCPs. Sendo assim, o uso de CCPs minimiza o risco de sobrecarga volêmica, principalmente em cardiopatas, nefropatas e hepatopatas, além de diminuir o tempo necessário para infusão. Ao se comparar o modo de preparo, os CCPs não precisam ser descongelados e podem ser armazenados em temperatura ambiente. O tempo necessário para a preparação e administração de plasma é, usualmente, de uma a duas horas, enquanto os CCPs podem ser infundidos de imediato (sem prova cruzada ou tipagem) e com taxa de infusão rápida. Os CCPs têm perfil de segurança melhor do que o PFC, porque eles passam por etapas de inativação viral, minimizando o risco de transmissão de uma variedade de agentes infecciosos.  O uso do plasma está associado a um risco maior de anafilaxia e TRALI que os CCPs. Deste modo, diversos guidelines colocam o CCPs como primeira escolha para correção emergencial da anticoagulação induzida por cumarínicos em caso de sangramento importante ou necessidade de cirurgia de urgência. 

Cirurgia Cardíaca:  Diversos fatores como hemodiluição, consumo de fatores de coagulação, danos microvasculares e fibrinólise contribuem para o risco de sangramento na cirurgia cardíaca. Esses prejuízos, associados à hemodiluição  acarretam na diminuição dos fatores II, VII, IX e X e geram aumento do sangramento pós-operatório. Embora o uso do CCPs esteja relatado na literatura neste cenário, ainda faltam estudos prospectivos que avaliem os riscos e benefícios do seu uso.

Trauma: Os CCPs contêm doses concentradas de todos os fatores da via extrínseca. Esta é a principal via da coagulação implicada no trauma, cenário no qual há dano endotelial e exposição do fator tecidual. Portanto, é justificável que os CCPs possam ser úteis no tratamento da coagulopatia dilucional do trauma. Entretanto, novamente, ainda faltam estudos prospectivos.

Eventos Adversos:

Complicações trombóticas venosas (TVP, CIVD) e arteriais (AVE, IAM, TEP); e de forma menos frequente, reações alérgicas e infecção viral. Incidência de 1,4% de eventos tromboembólicos relacionados à administração de CCPs. 

Recomendações da Sociedade Européia de Anestesiologia:

  • Pacientes com sangramento severo perioperatório que estejam em uso de cumarínicos devem receber CCPs e vitamina K intravenosa antes de qualquer outra medida de controle hemostático.
  • A terapia guiada por metas com o uso de concentrados de fatores (CCPs) pode reduzir os custos associados à transfusão no trauma, cirurgia cardíaca e transplante hepático.

Referências:

Management of severe perioperative bleeding: guidelines from the European Society of Anaesthesiology Eur J Anaesthesiol 2017; 34:332–395 

Prothrombin Complex Concentrates for Bleeding in the Perioperative Setting.  Anesth Analg 2016; 122:1287-300